quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Wokshop sobre Eficiência Energética

Contribuições do INEE ao: “Workshop sobre Incentivos Financeiros para que as Concessionárias de Eletricidade Invistam em Eficiência nos Usos Finais de Energia” no Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo em 23 de Julho de 2007
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Jayme Buarque de Hollanda
Diretor-Geral INEE

Registramos a seguir duas propostas que, pela experiência do INEE, poderão aumentar o interesse das concessionárias elétricas em investirem no aumento da eficiência energética no uso final.

1. Medição de resultados


“When you can measure what you are speaking about, and express it in numbers, you know something about it...”
Sir William Thompson, Lord Kelvin (1824-1907)
Embora ainda haja resistências para que uma concessionária elétrica patrocine o emprego de equipamentos mais eficientes, de seus consumidores, as empresas estão cada vez mais conscientes de que a ineficiência no uso final de seus consumidores tende a ser um péssimo negócio em longo prazo e de que há mecanismos que podem transformar estas imperfeições de mercado em receita.

Uma das principais dificuldades associadas a qualquer programa de conservação de uso final de energia, no entanto, é o de medir e avaliar o “gasto de energia que deixa de acontecer”. A idéia é difícil de ser absorvida em um ambiente de negócios em que a receita depende da venda de kWh.

Em essência, é preciso definir duas questões: como medir e quem medem.

Como medir

Em certos casos o aumento da eficiência ocorre em uma instalação bem definida o que facilita a mensuração. Entretanto, é preciso considerar o efeito de fatores que, eventualmente condicionam os valores de referência (caso base). Assim, por exemplo, na troca de um sistema de refrigeração ambiental antigo por um mais eficiente, se a medição “ex-ante” (base) for feita no verão de um ano excepcionalmente quente e a “ex-post” também no mesmo período, mas em um ano com temperaturas amenas, o “salto” de eficiência avaliado pode ser muito maior do que o real.

Empresas de Serviços de Energia ESCO têm como atividade-fim ganhar com o aumento de eficiência energética de seus clientes. Para consolidar a atividade, elas precisaram aperfeiçoar o tema da medição, básico para sua atividade. Para tanto, elas criaram a Efficiency Valuation Organization – EVO[1] (www.evo-world.org), uma organização sem fins lucrativos com a missão de “desenvolver e promover o uso de protocolos, métodos e ferramentas padronizados que quantifiquem e gerenciem os riscos e benefícios de desempenho (performance) associados aos negócios relacionados à eficiência no uso final de energia e de água e energia renovável (“develop and promote the use of standardized protocols, methods and tools to quantify and manage the performance risks and benefits associated with end-use energy efficiency, renewable energy, and water efficiency business transactions.”).

Assim, diante deste tipo de problema, estas normas podem proporcionar uma excelente base para que as concessionárias se orientem quanto à avaliação de resultados em projetos específicos.

Um segundo grupo importante de atuações ocorre de forma mais extensiva em programas de troca de lâmpadas fluorescentes compactas ou de geladeiras, onde o fenômeno a ser medido acontece em milhares de pontos e os efeitos dependem de decisões individuais sobre hábitos de uso e das características de qualidade dos novos equipamentos. 

Como considerar os resultados do programa em termos de consumo de energia e em redução de demanda de potência? Neste caso a única forma para avaliar o resultado é usando ferramentas estatísticas em que o exame de uma amostra permite avaliar os parâmetros para o universo analisado.

Assim, como no caso acima, é importante desenvolver protocolos e padrões estatísticos de análise que estabeleçam os níveis de erros que podem ser aceitos, metodologias de amostragem etc.[2].

Quem mede
Um princípio básico de gestão é o de criar independência entre quem executa uma tarefa e quem a avalia.

No caso da eficiência energética isto é particularmente importante pois a referência sobre “o que teria acontecido” fica aberta à imaginação e a escolha de critérios. A tendência é que a pessoa simpática ao tema tenda a exagerar na avaliação de resultados positivos. 

Nessas circunstâncias, além das normas externas, é de todo conveniente que haja também, uma organização externa e independente, com capacidade para auditar os números e fornecer um parecer. Este caminho foi adotado, por exemplo, pelo PROESCO, programa de financiamento de ESCOS e consumidores finais do BNDES, que visa mitigar os riscos assumidos pelo banco, cuja garantia é o fluxo de “não despesas” (= receita) gerado pelas economias de energia observadas.

Resumo e Propostas:

1.      Estudar formas de adotar no Brasil a metodologia EVO (ou de outra organização assemelhada) com as eventuais adaptações às circunstâncias que prevalecem no Brasil
2.      Desenvolver metodologia estatística para os programas de eficentização que ocorrem em um número grande de pontos
3.      Credenciar instituições para desempenhar o papel de auditoria externa de Medidas e Verificações.
Note-se que o objetivo aqui são as próprias empresas interessadas em obter uma avaliação real dos resultados de ações de aumento de eficiência no uso final. Embora seja conveniente a presença da ANEEL, na prática estas atividades têm mais sentido se lideradas por uma entidade como a ABRADEE, que congrega as empresas de distribuição.

2. Aplicando a eficiência a todas as formas de energia


Desde a criação do PROCEL, o conceito de eficiência energética, aplicado aos programas de uso final, tem-se limitado àqueles em que há ganho de eficiência de energia elétrica.

Esta visão exclui situações em que o aumento da eficiência, no sentido mais amplo e importante do conceito[3], decorre da troca de equipamento que substitui eletricidade por outra fonte ou, vice versa, nos casos em que outra forma de energia substitui a energia elétrica. Dentre os diversos exemplos, apresentamos pelo menos três que afetam diretamente as concessionárias elétricas e onde os resultados do aumento de eficiência podem ser avaliados. 

Incentivo ao uso de Veículos Elétricos (VE)
Por definição, são veículos acionados por, pelo menos um motor elétrico. Por uma série de fatores este acionamento é bem mais eficiente[4] que o realizado diretamente por motores de combustão interna.

Há diversos tipos de VE, mas interessam, para o presente, os que dependem da rede elétrica. Os mais simples são os VEB - veículos elétricos a bateria e os VEHP - veículo elétrico híbrido “plug-in”. O último é um veículo elétrico cuja bateria é dimensionada para proporcionar uma autonomia que atenda as necessidades diárias mais freqüentes dos consumidores, normalmente em trajetos urbanos (nos EUA, por exemplo, mais de 50% dos deslocamentos diários é de até 40 km). Tais veículos têm a bordo um gerador que garante uma autonomia maior caso tenha que se deslocar por uma distância maior.

Ora, o uso de energia elétrica em transportes é o único novo mercado para as concessionárias elétricas cujas cargas tradicionais tenderão a reduzir com o aumento da eficiência energética no uso final. O salto de eficiência também deve atrair os consumidores com a redução do custo operacional do veículo:
Com efeito, usando as tecnologias atuais, um VEB sedã usa 17 kWh para percorrer 100 km, a um custo aproximado de R$ 8,00 (tarifa residencial com impostos). Para fazer o mesmo percurso, com um carro a gasolina deve usar uns 8 litros a um custo (na bomba) aproximado de R$ 24,00!
Tanto VEB quanto VEHP para uso individual ainda são relativamente caros. Os progressos tecnológicos, no entanto têm sido enormes e as projeções apontam pelo crescimento do seu uso, pois o acionamento é tecnicamente mais simples e os preços dos componentes com tendência a reduzir custos. No entanto, há diversos veículos elétricos no mercado cuja viabilidade é perfeitamente determinada[5] cujo pode ser estimulado pelas concessionárias elétricas. Equipamentos de logística são candidatos importantes em curto prazo: uma empilhadeira elétrica consome 7 vezes menos energia que a empilhadeira acionada com GLP. 

Co-geração
O uso mais eficiente para o GN é, sem sombra de dúvida, a co-geração que pode transformar em energia útil (calor / frio e energia elétrica) até 85% da energia do gás e independe de escalas[6]. Na geração central ela não passa dos 40% quando se computam as perdas da conversão e as de transmissão e distribuição.

Em uma análise puramente energética[7], a energia elétrica adquirida a um co-gerador pode ser mais interessante que a comprada de uma geradora central, com custos de transmissão crescentes para a concessionária. Normalmente a unidade de co-geração é dimensionada para suprir a energia térmica; a geração elétrica otimizada é muitas vezes superior às necessidades do consumidor e a concessionária tem como usar esta geração distribuída.


Aquecedores solares e painéis

Há diversos estudos mostrando a conveniência para a concessionária de usar a energia solar, diretamente, junto ao ponto de consumo, pois assim se consegue aumentar o uso dos sistemas de distribuição e evitar os custos de transmissão com perspectivas crescentes, tendo em vista que o uso de chuveiros elétricos, freqüentemente no horário de ponta, se apresenta muito disseminado. Assim, o aquecimento com a energia solar ajudaria a reduzir a ponta de carga e economizar GLP ou GN. Isto é verdade tanto para os sistemas passivos (que substitui o chuveiro elétrico) como o foto-voltáico cujos custos vêm se reduzindo.

As tecnologias acima, micro-cogeração, solar, foto-voltáica e VEHP (que tem a bordo um gerador de 10-20 kW e que quando estacionado fica conectado com a rede elétrica), são formas de geração distribuída. O uso destes equipamentos tem efeito direto na rede da concessionária e no seu mercado. Essas tecnologias têm perspectivas de custos decrescentes e as concessionárias devem criar, o mais cedo possível, uma estratégia que as prepare para o  momento em que venham a se tornar competitivas com os custos de fornecimento das concessionárias, podendo então alterar seu mercado cativo.

Por outro lado, há detalhes com os quais o consumidor não pretende se envolver pois, a rigor, busca soluções para os problemas energéticos e a própria concessionária poderá incorporar, como vantagens, suas novas soluções e seu leque de opções de atendimento do mercado. Entender as novidades pode gerar diversas oportunidades de ganho para as concessionárias, se não de forma direta, através de empresas do grupo com uma aptidão mais focada nestes negócios descentralizados. Hoje apenas as concessionárias de gás estão usando esta estratégia.

Neste cenário, as concessionárias correm o risco de, ainda que gradualmente, se tornarem “back-up” de sistemas descentralizados em parte expressiva do mercado. A alternativa de ganhar com as novas oportunidades – através do serviço regulado ou a partir de empreendimentos não regulados – é mais fácil de perceber com antecedência a partir de um exame neutro das oportunidades e ameaças que se colocam.



[1] Esta associação deu seqüência a uma organização anterior denominada IPMVP cujo antigo protocolo foi traduzido para o Português pelo INEE.

[2] O INEE, junto com SBE – Sociedade Brasileira de Estatística , a pedido de uma concessionária preparou uma proposta de metodologia. A UNICAMP, em 1998, fez estudo desta natureza para o PROCEL no Ceará (coordenação do prof. Gilberto Januzzi).
[3] Onde se visa a redução da energia primária.
[4] Opera melhor no regime de “arranca e pára” que caracteriza o uso veicular urbano; a eficiência é elevada em uma faixa grande de velocidades; não gasta energia quando parado no sinal ou no trânsito e permite implementar o “freio regenerativo” (o motor é transformado em gerador, parando o veículo enquanto carrega a bateria para uso futuro) que recupera parte da energia inercial normalmente desperdiçada pelo freio dissipativo.
[5] Sobretudo veículos pesados (onde as pesadas baterias chumbo ácido não são um problema), que rodam em circuitos fechados de algumas dezenas de km. .
[6] A Honda tem uma linha de co-geração doméstica que produz 3kW térmicos e 1 kW elétrico com eficiência de 85%.
[7] Supondo, por exemplo, a remoção de algumas aberrações como, por exemplo, a oferta de tarifas reduzidas a clientes que querem instalar geração de ponta, uma prática ilegal (fere a isonomia pois consumidores recebem o mesmo serviço com tarifas diferentes) e que representa um “tiro no pé” para a concessionária.

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